Éramos uns três ou quatro dos da Malta, em conversa, ao cimo da Rua Direita, às portas da saudosa “Loja do Vasco”. Bem perto, com a enxada ao ombro, um dos da terra, já grisalho, cigarro de mortalha ao canto da boca.
A história passou-se já lá vão uns quarenta e cinco anos.
A páginas tantas surge um inglês, que andava em passeio de carro na região. Coisa até nem muito corrente naquele tempo. O inglês interpelou o nosso trabalhador, chamemos-lhe Sr. Joaquim, e com gestos mímicos procurava indicação do melhor caminho para ir até ao rio. Era Verão, uma tarde de calor a convidar a um refrescante banho no Salgueiral.
-The river, the river, dizia o estrangeiro. E bracejava com os braços a imitar movimentos de quem nada.
Percebido nos seus intentos, o inglês aguardou a resposta. E ela veio e da seguinte forma, da boca do Sr. Joaquim.
-Já percebi…o rio…tomar “banheichane”…é fácil. Desce a rueichane, segue, vira à esquerdaichane…depois à direiteichane…
Claro, nós, os da Malta, em total gozo, a conter a custo o riso e o estrangeiro sem patavina perceber. Até que nos decidimos intervir:
-Hey, Sir, the river? You go down the street, you turn on the left…por aí fora e lá demos a explicação.
Agradecido, o inglês, lesto, deu à sola e pôs-se a caminho do Salgueiral. E nós, claro, no rescaldo, desde logo prontinhos para o deleite do ainda tão fresquinho episódio. Mas, nem tempo tivemos. É que o Sr. Joaquim, com ar circunspecto, abeirou-se do grupo e atirou-nos:
-Oh pessoal, mas raio de ideia foi a vossa? Pr’a qu’é que foi aquela lenga-lenga p´ró homem? Com certeza julgam que ele não entendeu tudo o que eu lhe disse?
Nuno Espinal