Confesso que não gostava de fado. Direi mesmo que o detestava. Ia ao ponto de o considerar música menor. Manifestava, esta opinião, com a convicção de uma grande verdade. Mas nunca, e soube-o depois, com a convicção de um sentimento meu. Um sentimento já expurgado de uma enormidade de preconceitos, na política forjados.
Mas, pronto, era assim. Fado, em mim, era pura e simplesmente coisa para excluir.
Até que um dia…
Um privilégio do destino levou-me a casa de Amália Rodrigues para uma entrevista. (vidé espaço “Opinião” deste Portal). Guião elaborado, perguntas previamente pensadas.
Mas, qual quê? Amália descompôs todo o delineamento redigido. Tudo, na entrevista, iria correr ao sabor do acaso, ao jeito de conversa, afinal à feição de Amália.
Fiquei fascinado, subjugado perante uma grande Senhora, de uma inteligência e sensibilidade profundas, acutilante e perspicaz. Recordo, já entrevista feita e em conversa que se prolongou, ter dito a Amália. “Sabe? A minha mulher gosta muito de seu último CD”. Resposta pronta de Amália: “Olhe, isso significa que o senhor não gosta.”
Fiquei embatucado, atrapalhado. Este imediatismo certeiro de Amália definia o seu enorme discernimento, a sua grande inteligência.
Estive em casa de Amália umas três horas. Ouvi-a, fiquei rendido. Pensei: O fado não pode ser esta coisa menor que apregoo. Dediquei-me, desde aí, ao conhecimento do fado. Sobretudo li livros e documentos sobre as origens e história do fado. Depois frequentei casas de fado e tertúlias. Escrevi uma sinopse sobre a historiografia do Fado, tornei-me um apaixonado, sorvo o fado com uma desmedida paixão.
À grande Amália o devo. Obrigado Amália.
Nuno Espinal