No turbilhão de notícias do dia de ontem, destaco a da morte de Madalena Iglésias. Figura pontificante na rádio, nos anos 60, integrava o lote dos que eram pilares do então “nacional cançonetismo”.
Com Madalena Iglésias sobressaíam, entre outros, Maria de Lourdes Resende, Maria Clara, Simone de Oliveira, António Calvário, Artur Garcia, Maria de Fátima Bravo ou Maria José Valério.
Confesso que o produto “nacional cançonetismo” esteve completamente nos antípodas dos meus gostos musicais, quando, em plena vivência dos meus juvenis anos, no normal e típico emolduramento de preferências e adesões, elegia outros modelos musicais, a reboque do que era timbre da chamada “nouvelle vague”.
De França ecoavam as doces canções de Françoise Hardy, ou as pops de Sylvie Vartan, ou os ritmos mais rock de Johnny Hallyday, entre outras vozes gaulesas como as de Adamo, Mireille Mathieu, Claude François, France Gall, Richard Anthony, Charles Aznavour, Gilbert Bécaud, Edith Piaf e muitos mais.
Do Reino Unido, surgiam, a marcar uma nova era na música “pop”, os Beatles, a par de outros grupos de nomeada no universo anglo saxónico, como, por exemplo, os “Rolling Stones”, os “The Animals”, os “Bee Gees”, e os Manfred Man”, sem esquecer os “Shadows”, estes num registo instrumental mais light.
Em Portugal o movimento rock ganhava espaço e, na sua afirmação despontavam os Gatos Negros, os Conchas e posteriormente os Sheiks, o Conjunto de João Paulo, o Quinteto Académico, os Chinchilas e outros mais.
Surgiam, entretanto, vozes anti-regime, que criavam verdadeiros hinos de revolta e protesto, como, oriundas de Coimbra, as de Zeca Afonso e Adriano Correia de Oliveira e que, obviamente, eram a antítese do “nacional cançonetismo”.
Nesta onda a cançoneta nacional, associada ao regime salazarista, perdia terreno e alguns dos seus próprios intérpretes desligavam-se das suas amarras e, libertos, aderiam a novos autores, como o caso de Simone de Oliveira, quando interpretou a “Desfolhada” numa final da eleição da canção portuguesa concorrente à Eurovisão.
O nacional cançonetismo extinguir-se-ia sem deixar saudades.
Mas, curiosamente, ontem, perante imagens da televisão em que Madalena Iglésias cantava o “Ele e Ela”, ou surgia acompanhada de António Calvário, ou de Simone ou até de Artur Garcia, senti um misto de emoção e comoção que não pude evitar.
Em parte, porque fui transportado a um desfilar de recordações com o protagonismo desses cantores. E em grande parte pelo respeito que esses mesmos cantores me merecem. É que, ao contrário do que hoje tanto acontece, no reino da “pimbalhada”, estes cantores cantavam mesmo. E basta isso para prestar a minha homenagem muito sentida à grande Madalena Iglésias.
Nuno Espinal