Morreu Herberto Helder o “Poeta dos Poetas”.
Da sua pena publicámos no Miradouro poemas e excertos de poemas. O momento poderá ser o de enaltecer o seu tão alto contributo para a poesia portuguesa. Mas, não! Não lhe prestaremos homenagem póstuma, porque homenagem era procedimento que repudiava, pelo cinismo e hipocrisia que tantas vezes encerra.
Enaltecer sim mas a sua Poesia. E hoje com o Poema “Dons do Amante”, extraído da coletânea “Poesia Toda”, edição de 1990. E também um breve escrito tão definidor da sua obra.
A morte calou o Mestre. A morte não calou o Mestre.
Nuno Espinal
“O extremo poder dos símbolos reside em que eles, além de concentrarem maior energia que o espetáculo difuso do acontecimento real, possuem a força expansiva suficiente para captar tão vasto espaço da realidade que a significação a extrair deles ganha a riqueza múltipla e multiplicadora da ambiguidade. Mover-se nos terrenos dos símbolos, com a devida atenção à subtileza e a certo rigor que pertence à imaginação de qualidade alta, é o que distingue o grande intérprete do pequeno movimentador de correntes de ar.
Herberto Helder”
“DONS DO AMANTE
Sobre a tua cabeleira hei-de pôr, para as núpcias,
uma coroa de borboletas com suas
asas pintadas.
Terás de volta ao pescoço flores de abóbora,
em prata,
e a lua que para ti noites e noites forjei.
Andarás pelo povo sobre um cavalo em turquesa.
Um cavalo ardente e leve, animado
Pelo meu fogo de amor.
E a teus pés eu lançarei uma pedra quente quente:
o coração onde correm
milhões de gotas de sangue.
Herberto Helder”