Eis um documento que é referência a uma época que, nos meses de Verão, em Vila Cova, assumia caracterizações muito peculiares.
O folheto dava a conhecer o programa de uma das récitas apresentadas pela “Malta”, superiormente ensaiadas pelo Manuel Fernandes, no Salão Paroquial, corria o ano de 1964, em princípios de Setembro.
Ainda me lembro de algumas das peripécias vividas na exibição de vários números da récita. Por exemplo, o “telejornal” dito por mim e pela Juca. Um simples cartão foi recortado em rectângulo, a simular um ecrã de televisão. Eu e a Juca, cada um de sua vez, atrás do improvisado ecrã, com um foco de luz apontado, líamos umas larachas humorísticas por nós escritas, sobre coisas e loisas de terra. A rábula até nem estava a correr nada mal, até que a Juca, sabe-se lá porquê, desatou incontroladamente a rir, sem conseguir parar. Foi de tal maneira que contagiou a assistência. E então, quanto mais a Juca ria mais riam os espectadores e quanto mais riam os espectadores mais ria a Juca. Acabou por ser o momento mais hilariante da noite.
A récita contou ainda com um protagonista indesejado. Um apagão, que após várias ameaças se instalou definitivamente. De facto, enquanto se desenrolavam no palco os vários números, cortes de electricidade irritantes teimavam em perturbar os vários desempenhos. Mas o espectáculo lá ia decorrendo, já que a luz tornava a reaparecer. Num desses momentos de escuridão ouve-se, em pleno Salão, uma voz de falsete gritar: “Estou a ser apalpada”. Caro, foi uma risota pegada. Só que houve quem não gostasse. Uma senhora, mais preconceituosa, chegou mesmo a dizer: Vejam lá, que impropério…com o Senhor Prior presente…que falta de respeito, credo…
Entretanto, estava previsto que o espectáculo terminaria (o programa tinha sido alterado) com uma monumental Serenata de Coimbra.
Só que, quando em palco eu o meu irmão Quim Espinal e ainda o Oliveira Alves e o Toneca, trajados com improvisadas capas à estudante, nos preparávamos para atacar (tudo em play back) os primeiros acordes do Fado Hilário, faltou em definitivo e luz. Após alguns minutos de espera e dizendo o saber que a luz já não viria, deu-se, sem serenata, a récita por terminada.
Ao outro dia a Comarca de Arganil noticiava o espectáculo. O redactor tinha tido acesso ao programa e tinha obtido informações complementares. Só que não tinha assistido à récita. E então escrevia mais ou menos assim.
“A recita terminou com chave de ouro, com uma monumental Serenata de Coimbra, em que seis conhecidos fados emocionaram a assistência.”
“Que tempos e que saudades…”
Nuno Espinal