Alguns dos da Malta:
Da esquerda para a direita (em pé): Toneca (António Gabriel de Almeida) José Luís, Quim Espinal, Manuel António Fonseca (meio agaichado), Nuno Espinal, Lisboa Nunes e Abílio Vicente.
Sentados:Tó Cruz, Maria Augusta Vicente, Ana Kaupers e Elsa Oliveira.
Recordo-me bem.
Num setembro, passados que são uns cinquenta anos, numa tarde já com o sol a amainar, a “malta” em força, ali nas cercaduras do café do Vasco. Ela também lá estava. E que paixão, meu Deus, que paixão! Paixão recíproca, sabia-o. O enamoramento em crescendo, trocas prolongadas de olhares, mas…
Pois é! A coragem para a declaração, isso é que não atava nem desatava. Raios partissem esta minha timidez! Bem utilizava os meus mais sofisticados processos de sedução. “Bealcream” no cabelo, camisa atada na cintura, gola levantada à St. Tropez, popa à Elvis, enfim, todos os tiques da moda. Mas, a declaração que se impunha, o mote para o comprometimento, aí é que me faltava a coragem.
Foi então que, mesmo ali a jeito, uma velha bicicleta. Oportunidade de ouro para lhe mostrar uma habilidade.
-“Posso dar uma volta?”
- “Vá, mas tenha cuidado, olhe que só agora é que aprendeu a andar…”, aquiesceu o dono da velha pasteleira com ar apreensivo.
Qual quê? Sentia-me o maior, um verdadeiro ás do “tour”. Dei umas pedaladas até às tílias, fiz inversão, de quando em quando pé no chão, mais umas pedaladas, passei frente à malta, tudo a correr em grande e ela a ver. Ah, grande jogada esta, sentia-me a ganhar mais uns pontos, a paixão dela ia recrudescer. Continuei a marcha, nova inversão, aproximei-me de novo da malta, a famosa curva ao café do Vasco e…
Inesperadamente surge-me em sentido contrário um carro de bois. Oh raio, qual curva qual quê! Fui a direito, atrapalhei-me, bicicleta aos esses, “Ti” Augusto Russo com a vara dos bois em riste, e pumba! Nunca vi um corno de bois tão perto dos olhos. Eu e bicicleta no chão, só a canga nos fez parar.
Que barracada! E logo a malta ali a rir a bandeiras despregadas, grande humilhação, que gaita, todo o processo de enamoramento a tornar à estaca zero.
Foi então que ela, não muito tempo depois, surge com algodão, álcool e mercuriocromo. Com todo o cuidado e doçura desinfectou-me as feridas. Ardor? Ardor e muito, mas não dos arranhões mas sim do coração. De tal modo que ganhei toda a coragem do mundo e lhe disse:
-Sabes que gosto muito de ti!
-Eu também gosto muito de ti, respondeu-me.
Ah, bendito trambolhão!
Nuno Espinal