
A chamada “educação formal” é sempre um reflexo das ideologias dominantes, pelo que o seu conteúdo instrutivo é modelo dos regimes políticos em vigência.
A propósito, vêm à baila os manuais escolares, ao tempo em que a Dª Anita era professora na velha escola de Vila Cova.
Já lá vão 50 e até mais anos.
Os livros impostos, livros únicos, eram uma apologia aos “pobrezinhos e honrados”, às “virtudes do trabalho”, a “Deus, Pátria e Família” a “Salazar, Salazar, Salazar”, ao “servir, respeito e obediência”, aos “ feitos históricos e heroicos dos portugueses” e por aí fora.
Em especial os Livros de Leitura e da História de Portugal davam-nos a ideia de uma dimensão de Portugal, no Mundo, que criava às crianças a ilusão de um peso que o país estava muito longe de possuir. Ilusão, essa, que a muitos acompanharia para o resto da vida.
Anos passados, após a primária, e já instruído por outros saberes, permitiu-me o período de férias uma estada em Vila Cova.
Já, então, a televisão era vista num ou noutro café, no cinzentão de notícias a preto e branco difundidas. E, amiúde, lá vinha à fala dos jornalistas do telejornal a questão da “guerra fria”: Rússia, Estados Unidos, Kennedy, Kroutchev, ONU, etc.
Ora, quis o acaso que em determinado dia me pusesse à conversa com o Sr. José Martinho, homem amigo, franco, simples e leal.
Não descortino o porquê, mas recordo que o Sr. José Martinho, a certa altura, me disparou com esta:
-Sabe que a América e a Rússia estão quase a entrar em Guerra, não sabe?
-Oh Sr. Zé, se o amigo o diz…
-E sabe porque é que ainda não entraram?
-???...
-Estão à espera de saber para que lado é que Portugal cai…
Fiquei sem argumentos e a conversa, com um aperto de mão amigalhaço, por ali ficou.
O Sr. José Martinho já não pertence ao mundo dos vivos. Mas viveu com uma convicção que lhe deu sempre grande orgulho: Ai de quem com Portugal se metesse!...
Nuno Espinal