Com os meus 64 anos e no estádio de um casamento estabilizado, não tem muito sentido a pergunta: “És ciumento?” Perguntem-me antes: “Foste ciumento?” E, aí, logo respondo. “Fui”. Normalmente ciumento, é certo, longe, muito longe, de um estado de ciumaria patológica, mas fui. E até cheguei a ser, ridiculamente ciumento.
Vamos então à historieta.
Passaram já mais de quatro décadas, por volta dos meus dezanove anos, travei-me de amores por uma Joana (olá Joana!) morena, linda.
Filha de mãe espanhola, vivemos um enamoramento na graça dos nossos juvenis anos. Até um dia a Joana ir de férias com os pais, a Espanha. Quando regressou, quase um mês depois, veio-me com as narrativas das peripécias passadas em terras castelhanas. Entre os protagonistas das suas histórias um houve que me deixou em total desatino. Um tal Javier, que passou a ser tema principal das tais narrativas. “Un chaval guapíssimo, com éducación, mui formal”, segundo as palavras da espanholíssima mãe da Joana. Fiquei possesso, passei a odiar tudo o que fosse espanhol. Nada naquele país me seduzia. Nem as lindíssimas sevilhanas, lindas de morrer quando trajadas nas suas vestes a rigor. Tudo reles naquela terra, tudo uma canalhada.
Mas, toda esta ridícula ira foi de curta duração. Os juvenis anos deram-me a aquietação e inquietação de outros amores. A Joana é hoje avó e uma amiga de amizade sólida e sincera. E o Javier tornou-se mesmo amigo da família da Joana e meu amigo também e ainda há três anos confraternizámos os dois numa sua visita a Lisboa.
Ridículos aqueles ciúmes, pela forma como os exteriorizei e mais ainda porque eram perfeitamente infundados.
Tornei-me um fã da Espanha e dos Espanhóis. Torço hoje pela candidatura ibérica à organização do mundial de futebol. E se ontem vibrei com os quatro golos marcados ao Casillas, tiro o chapéu, com uma grande vénia, aos seus títulos de campeões da Europa e do Mundo. E, mesmo agora, enquanto escrevo este apontamento, ouço, em “CD”, as “Noches en los jardinos de España”, desse grande compositor de Cádiz que foi Manuel de Falla.
E Viva Espanã!
Nuno Espinal